Opinião: reflexões sobre o dia da Consciência Negra

Por Janaina Neres – Pedagoga/Nupad/FM e Integrante da Equipe do Projeto Racismo Institucional: A Doença Falciforme e Seus Contextos Sociais.

Nossos antecedentes, sequestrados de regiões do continente africano, nunca foram tratados como pessoas. Pelo contrário, foram objetificados. Tornaram-se propriedade do outro, foram vendidos, alugados, hipotecados, confiscados e doados. Legalmente não tinham direitos e não podiam possuir bens, mas podiam ser castigados e punidos.

Em 13 de maio de 1888 ocorreu a assinatura da Lei Áurea, colocando um fim à escravidão e jogando nas ruas milhares de negras e negros sem nenhuma política social reparadora. Após 1888 surgiram outros decretos, que continuavam a punir a população negra, tais como, a Lei dos Vadios e Capoeiras em 1890, em que aqueles que estivessem pelas ruas sem trabalho ou residência comprovada iriam para cadeia.

Onde mais poderiam estar?

Foto: Divulgação

A despeito dessa situação de injustiça a que a população negra foi submetida ao longo da constituição histórica do nosso país, foram surgindo aos poucos, as sociedades insurgentes, articulando esforços para colocar um fim a esse modelo hegemônico de desvantagens, dentre as quais podemos citar:  1914 – Organização Sindical de Negros em Campinas; 1945 – Renascimento do Movimento Negro; 1971 – Surgimento do Grupo Palmares; 1978 Consolidação do Movimento Negro Unificado (MNU).

A Marcha Zumbi dos palmares, no dia 20 de novembro de 1995, que reuniu em Brasília cerca de 30.000 pessoas, resultou de um esforço desses movimentos, a fim de, denunciar às condições sub-humanas as quais ainda viviam (e vivem) negras e negros no Brasil – situação análoga aos mais de 300 anos de escravidão. Buscou também evidenciar a falácia do mito de “democracia racial”.

A marcha resultou no reconhecimento por parte do Governo Federal do racismo no Brasil e propiciou a criação de um Grupo de Trabalho Interministerial de Valorização da População Negra.

Avanços importantes surgiram após 1995 como uma forma de reparação das desigualdades vivenciadas pela população negra desde sua escravização até o abandono no período pós-abolicionista. Entretanto, apesar dos decretos e políticas de ações afirmativas existentes, essa parcela da população ainda se encontra vulnerabilizada pelo racismo estrutural e estruturante em nossa sociedade.

A falta de direitos e as práticas de castigo e de punição exercidos no período escravagista, são perpetuados ainda hoje, e se expressam de várias formas, a saber: no genocídio e no encarceramento em massa de jovens negros; nas violências obstétricas impostas às mulheres negras; nos agravos à saúde e no alto índice de mortalidade por causas preveníveis e evitáveis; na falta de acesso à uma educação de qualidade; nos baixos salários, moradias precárias e uma série de outras iniquidades evidenciadas cotidianamente.

O 20 de novembro, Dia da Consciência Negra, é marcado pela reflexão de como a população negra está inserida na sociedade. Vale reforçar que essa reflexão precisa ser diária, empática e deve partir de todos/as, pois como disse Ângela Davis: – “Não basta não ser racista, é preciso ser antirracista.”

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