Estudo pioneiro investiga subtipo pouco conhecido da doença falciforme

De acordo com dados do Programa de Triagem Neonatal de Minas Gerais, a doença falciforme acomete um a cada 1.400 nascidos vivos

Foto: Carol Morena

Estudo realizado por alunos e professores do Programa de Pós-Graduação em Ciências da Saúde – Saúde da Criança e Adolescente, da Faculdade de Medicina da UFMG, ajuda a compreender um dos subtipos da doença falciforme em crianças, a Sβ/talassemia. Destaque em congressos científicos da área, o estudo sistêmico investigou fatores que estão associados a essa enfermidade, ainda pouco pesquisada, para melhor abordagem clínica e qualidade de vida dos pacientes.

As hemoglobinopatias são doenças genéticas que afetam a hemoglobina, compreendidas em dois grupos: aquelas que modificam e assumem o formato de foice e aquelas que diminuem a síntese da hemoglobina.  A doença falciforme faz parte do primeiro grupo. Com isso, os glóbulos podem morrer prematuramente, causando a escassez da célula.

O trabalho, realizado em parceria com a Fundação Hemominas, analisou crianças com doença falciforme de perfil hemoglobínico de Sβ/talassemia, diagnosticadas pelo Programa de Triagem neonatal de Minas Gerais (PTN-MG) e acompanhadas no ambulatório do Hemocentro de Belo Horizonte (HBH).

“A Sβ/talassemia é um subtipo da doença falciforme caracterizada pela coexistência de um alelo β S e um alelo β-talassêmico e apresenta um espectro clínico variado”, esclarece a autora do estudo, Érica Louback de Oliveira, pesquisadora do Núcleo de Ações e Pesquisa em Apoio Diagnóstico (Nupad).

Foram realizados exames hematológicos que reportam a quantidade e a distribuição das células do sangue, além do sequenciamento do gene da hemoglobina que permite a identificação das mutações causadoras de talassemia beta heterozigota associada à Hb S.

“Os pacientes também foram avaliados pelo Doppler Transcraniano Cerebral – exame diagnóstico com técnicas de ultrassonografia – que avalia a velocidade do fluxo de sangue nas artérias cerebrais, a fim de analisar o risco de acidente vascular cerebral”, comenta Érica.

Parâmetros

De acordo com a pesquisadora, o trabalho avaliou os parâmetros modulantes da doença, ou seja, o conjunto de fatores que podem estar associados à doença e sua gravidade, como os hematológicos, clínicos e genéticos. “Um exemplo de modulador é quando alguns pacientes herdam além da Sβ/talassemia, a Alfa talassemia, que na literatura é descrita como um fator que pode melhorar o quadro clínico do paciente”, exemplifica.

O objetivo foi identificar as mutações e comparar com dados laboratoriais e clínicos para auxiliar no melhor prognóstico, abordagem médica e adoção de medidas preventivas para qualidade de vida do paciente. Além disso, a pesquisa pioneira auxilia no aconselhamento genético, que é uma avaliação feita por profissional de genética clínica. A finalidade é identificar condições hereditárias capazes de afetar um indivíduo ou suas futuras gerações.

“Em casos que as mutações no gene da hemoglobia inativam a produção de HbA, a doença falciforme resultante é a Sβ0-Talassemia (Sβ0-Tal). Mas, outras mutações podem apenas diminuir o nível de síntese da HbA, que resulta em Sβ+Talassemia, caracterizada por amplo espectro de gravidade clínica do mais brando ao grave. Nesse caso, quanto menor nível de produção da HbA, maiores serão as manifestações clínicas”, explica a pesquisadora.

Ela acrescenta que, em ambos os casos, alguns pacientes têm a necessidade de hemotransfusões frequentes ou uso de medicamentos como a hidroxuréia, que aumenta a hemoglobina e diminui o número de ataques. ” A doença falciforme é considerada problema de saúde pública no Brasil e compreender sua incidência e histórico é importante para que esses pacientes vivam melhor”, conclui.  

Hemo 2018

O primeiro estudo sistêmico do Brasil sobre o tema ficou entre os finalistas do Congresso Brasileiro de Hematologia, Hemoterapia e Terapia Celular (Hemo 2018), terceiro maior evento do mundo ocidental da especialidade. Os projetos selecionados para a primeira etapa foram expostos em painéis e apresentados pelos autores.

Para Érica, o congresso é um evento de grande valor científico, que proporciona aos participantes discussões e atualização de assuntos importantes, além de colaborar para o desenvolvimento de pesquisas e da prática clínica. 

Pesquisa em detalhes

Estudo: “Incidência e história natural da doença falciforme do subtipo s/beta-talassemia em coorte de crianças triadas pelo programa de triagem neonatal de Minas Gerais e acompanhadas na Fundação Hemominas” 
Mestranda: Érica Louback de Oliveira 
Orientador: Marcos Borato Viana
 Co-orientador: André Rolim Belisário Bolsista de Iniciação científica: Natiely Pereira Silva 
Médicos colaboradores: Dr. Paulo do Vaz Resende e Dra Célia Maria da Silva, ambos da Fundação Hemominas.