Pesquisa alerta sobre possibilidade de sintomas graves na doença falciforme SC

*Marcela Brito

Crises intensas de dor, que acometem pacientes com Doença Falciforme, são associadas pela literatura a um subtipo mais comum da doença, a hemoglobinopatia SS. No entanto, pesquisa desenvolvida pelo Programa de Pós-Graduação em Saúde da Criança e do Adolescente, da Faculdade de Medicina UFMG, reforça que outro subtipo também pode apresentar os mesmos sintomas, a hemoglobinopatia SC. O resultado da pesquisa rendeu prêmio no Congresso Brasileiro de Hematologia, Hemoterapia e Terapia Celular (Hemo 2018), e ajudará nos cuidados, principalmente das crianças, com anemia falciforme.

Paulo do Val Rezende,  autor da pesquisa e hematologista pediátrico. Foto: Carol Morena.

“O que reparamos atendendo crianças é que muitos pacientes SC tinham crises de dor que precisavam até de internação. Nós não entendíamos o porquê disso, já que esse tipo é apresentado nos livros e artigos com menos sintomas”, comenta o autor da pesquisa e hematologista pediátrico, Paulo do Val Rezende.

De acordo com ele, os profissionais podem minimizar essas queixas por estudarem que o SC tem menos sintomas. “Entretanto, na prática, ele pode encontrar pessoas com a mesma intensidade de sintomas do tipo SS. Assim, quando a mãe chega com a criança com dor, esses sintomas precisam ser observados com atenção”, alerta.

Segundo Paulo, além dos profissionais da saúde, é preciso que a família e pessoas que convivam com os pacientes estejam atentos a essas questões, pois afetam diretamente na qualidade de vida das crianças. No ambiente escolar, por exemplo, de acordo com o pesquisador, os profissionais podem reforçar a hidratação oral da criança para reduzir os sintomas.

História natural

Para o estudo, o pesquisador avaliou a história natural da doença, observando a incidência de sintomas em 461 crianças com doença falciforme SC. Foram coletados dados de crianças que realizaram o Teste do Pezinho pelo Programa de Triagem Neonatal de Minas Gerais (PTN-MG) e foram acompanhadas pelo Hemocentro de Belo Horizonte (HBH) da Fundação Hemominas, entre 1° de janeiro de 1999 até 31 de dezembro de 2014.

A partir disso, foi desenvolvido um banco de dados com informações clínicas, observando a incidência de crise de dor, infecções, acúmulo de sangue no interior do baço, risco de acidente vascular cerebral isquêmico (AVCi), priapismo (vaso oclusão no pênis), além de consultas oftalmológicas, cardiológicas e ortopédicas.

Dores intensas

Como resultado da análise, observou-se que apenas 25% das crianças com doença falciforme SC não apresentaram crise de dor. Já entre os sintomas analisados, o sequestro esplênico aguda (SEA) – acúmulo de sangue no baço que provoca sintomas como palidez intensa e aumento da dimensão do órgão – foi observado em 68 crianças, 14,8% dos pacientes. Esses sintomas podem ocorrer com intensidade variada nas crianças com hemoglobinopatia SC, de acordo com o hematologista.

A pesquisa também observou que apenas 7,8% das crianças não apresentaram infecções.  Outra questão apontada foi a quantidade de casos de óbitos com causas indeterminadas: seis das 23 mortes registradas. “Esse valor mostra uma dificuldade das equipes de saúde em reconhecer e identificar as complicações e intercorrências em relação à doença falciforme”, esclarece Paulo.

O estudo revelou ainda que existem dificuldades no processo de agendamento de exames e consultas com especialistas. O pesquisador explica que esse caminho começa pela Fundação Hemominas, que encaminha o paciente para rede básica de saúde, que é responsável por agendar as consultas médicas. De 232 pacientes encaminhados para o oftalmologista, apenas 59 chegaram a realizar fundoscopia, isto é, exame do fundo do olho,  para avaliação de retinopatia falciforme. “Esses dados mostram que há muito para melhorar nas interconsultas e o fluxo de encaminhamento”, avalia o pesquisador.

Para ele, é importante alertar os profissionais da saúde sobre os achados da pesquisa. “Isso chama a atenção ao fato desses pacientes terem riscos de apresentar crises ou sintomas graves que precisa ser valorizado e reconhecido”, conclui.

*Marcela Brito – estagiária de Jornalismo

Edição: Karla Scarmigliat

Tese: Estudo das Manifestações Clínicas e Hematológicas da Doença Falciforme Subtipo SC e SD em Crianças do Programa de Triagem Neonatal de Minas Gerais.

Autor: Paulo do Val Rezende

Orientador: Marcos Borato Viana