A confirmação do diagnóstico de Guilherme para a hiperplasia adrenal congênita (HAC) veio algumas semanas após a realização da triagem neonatal (teste do pezinho), feita em junho de 2015. A doença genética, que não tem cura, leva à produção insuficiente de importantes hormônios no organismo, como o cortisol e a aldosterona, e pode provocar a morte se não for identificada e tratada precocemente.

“Sabia da importância do teste do pezinho. Levei ele no posto para fazer a coleta com cinco dias de vida”, conta a mãe de Guilherme, Rosa Maria Mendes. Após saber da alteração no exame, a família, moradora de Vespasiano, na Região Metropolitana de Belo Horizonte, precisou comparecer à capital para realizar os testes confirmatórios. Foi o primeiro contato dos pais de Guilherme com a equipe do Nupad, responsável por executar o Programa de Triagem Neonatal de Minas Gerais (PTN-MG) que oferece tratamento gratuito e contínuo a todas as crianças do estado diagnosticadas a partir do teste do pezinho. Na oportunidade, foram passadas à família as informações iniciais da doença. “Perguntei se tinha cura, tratamento, se dava sequela, se poderia ter feito algo para evitar. Fiquei mais tranquila de saber que não estava em meu alcance, pois se tratava de uma doença genética”, diz Rosa.
O tratamento teve início antes mesmo do fechamento do diagnóstico, sendo realizado no Hospital das Clínicas da UFMG a partir do PTN-MG. “A médica explicou que ia entrar com a medicação, pois já estávamos no limite do tempo. O remédio não faria mal se a doença não se confirmasse, mas a falta poderia causar problemas”, recorda a mãe.
Os resultados confirmaram que a criança apresentava a forma clássica da HAC, considerada grave, e o tipo denominado “perdedora de sal”. Nessa condição, as glândulas adrenais, localizadas acima dos rins, não conseguem produzir quantidades suficientes de cortisol e aldosterona e o organismo apresenta deficiência na retenção de sódio, o que leva a um quadro grave de desidratação. Para controle, Guilherme passou a tomar duas medicações diárias, além de ingerir a quantidade de uma tampinha de sal ao longo do dia. “Isso era o mais importante, se não desse, não adiantaria nada e ele correria risco”, diz Rosa. Enquanto os medicamentos são previstos para toda a vida, a ingestão do sal foi feita até Guilherme completar seis meses. Para a mãe, essa etapa foi uma das mais difíceis, por provocar ânsia e vômito: “Tentei de várias formas, diluindo o sal na água, na colher. Foram os meses mais longos da minha vida”.
Cuidado constante
Próximo de completar um ano e seis meses, Guilherme já frequenta a escola e tem uma rotina normal ao lado dos pais. “Ele é abençoado, não para um minuto. É também um reloginho, se eu não despertar, ele acorda na hora do remédio”, brinca Rosa.
Uma das precauções tomadas pela mãe é manter uma pasta com todos os documentos do filho, contendo dados da doença e orientações de tratamento: “Onde o Guilherme está, a pasta está. O que importa é que ele está ótimo e não vai ter problema nenhum se tiver todos os cuidados”.

Sempre que necessário, a mãe atenta-se também em esclarecer sobre a doença a outros profissionais de saúde. “Tenho a preocupação de outros médicos e pediatras, no plano de saúde, não saberem o que é a hiperplasia. Então eu devo saber mais. Até hoje tenho problemas com isso. Se é urgência, tenho que explicar tudo”, admite.
Devido à insuficiência do hormônio cortisol no organismo, característica da HAC, outra orientação é aumentar a dose de hidrocortisona, um dos medicamentos prescritos diariamente a Guilherme, sempre que ele passar por alguma situação de stress, como extração dentária, processos febris e trauma. “Uma vez que Guilherme sofreu uma queda, ele foi ao hospital, fez o raio x e eu expliquei da hiperplasia. Com isso, a médica que o atendeu entrou em contato com a Dra. Cristina, responsável pelo acompanhamento dele, e confirmou as orientações”, relembra Rosa.
Interação e aprendizado
Atualmente Guilherme vem a Belo Horizonte a cada três meses, ocasião em que mãe e filho frequentam o Centro de Educação e Apoio Social do Nupad (Ceaps) enquanto aguardam a consulta no Hospital das Clínicas. O Centro desenvolve ações educativas e oferece um espaço para orientar e acolher familiares e pessoas acompanhadas pelo PTN-MG. “O melhor lugar que tem é aqui. Eu acho importante esse contato, você aprende, conhece os profissionais. Eu dou banho no Guilherme, ele dorme, brinca, interage com outras crianças”, diz a mãe.

Com uma filha de nove anos do primeiro casamento, Rosa destaca a importância de saber que a doença de Guilherme foi incluída no PTN-MG apenas em 2013, dois anos antes do nascimento do filho: “Eu sou muito sortuda. Muitas crianças podiam morrer com isso sem saber. Se fosse minha filha, ela poderia não estar aqui hoje. A gente sabe, tem o conhecimento e o tratamento. O que mais precisamos para ter uma vida normal?”.
PTN-MG
Desde 2013, o exame de triagem neonatal para a hiperplasia adrenal congênita é realizado pelo Nupad para todo o estado de Minas Gerais pelo PTN-MG, sob a gestão da Secretaria de Estado de Saúde (SES-MG).
Além da HAC, o PTN-MG faz o diagnóstico de outras cinco doenças: hipotireoidismo congênito, fenilcetonúria, doença falciforme, fibrose cística e deficiência de biotinidase.